sexta-feira, 13 de setembro de 2013

ARRANCADA ZALA-NAMBUANGONGO




TRAVESSIA DO UEMBIA

Em Zala, ainda a 07Ago61, ao anoitecer, depois de inventariadas as munições, alimentação, estado físico e moral das tropas, o comportamento do inimigo e tácticas utilizadas, o Comando decidido a avançar imediatamente sobre Nambuangongo ordenou às tropas fisicamente aptas que se aprontassem, montassem as viaturas e se colocassem em estado de prontidão e arranque.
Face a tal medida do Comando houveram reacções de oficiais subalternos, nomeadamente do Comando do Pelotão motorizado com Panhards dos Dragões de Luanda, Alferes Barão da Cunha.  O problema mais grave era a falta de munições sendo consideradas insuficientes as que haviam para fazer o percurso Zala-Nambuangongo de 44 Kms, sentido pela maioria como o mais perigoso pensando que o inimigo iria concentrar força e recursos para defender o seu bastião-forte.
Com o pessoal montado e alinhado para arranque onde chegavam notícias contraditórias ora de partir ora de ficar, os Oficiais em Reunião Geral discutiam a situação e possíveis consequências quer de ficar quer de arrancar em condições precárias de segurança militar.

TRAVESSIA DO UEMBIA

O Comandante Cap. Rui Abrantes, embora fortemente contrariado, deu-se por vencido perante a argumentação do risco que representava a falta de munições suficientes, aceitando que no dia seguinte se fizesse uma pista de aviação de modo a evacuar feridos e doentes e houvesse reabastecimento de munições e víveres frescos por via aérea. Aos Sargentos e Soldados chegaram, após a Reunião Geral dos Oficiais e ordem de desmontar e dormir a noite em Zala, rumores de troca azeda de argumentos incluindo a evocação do poder absoluto do Comandante em situação de Estado de Guerra.

TRAVESSIA DO UEMBIA

Assim, na manhã do dia 08Ago61, com enxadas, pás, latas e botas capinou-se uma área suficiente para aterrar os pequenos aviões DO-27, o Dornier. Este trouxe cunhetes de munições, correio e víveres frescos e evacuou feridos e doentes em várias viagens entre Zala e Luanda.
E, ironia trágico-cómica da nossa guerra, constatou-se que a maior parte dos cunhetes de munições trazidas eram de balas de madeira usadas na instrução militar. Em cima da hora prevista para arrancar foram precisas novas viagens do Dornier para trazer balas a sério. Já não houve tempo para examinar os novos cunhetes chegados de Luanda e logo distribuidos pelas viaturas destinadas à frente da coluna que arrancou às 18,00 horas desse dia 8.

RECEPÇÃO DO PESSOAL DO BAT.96 À NOSSA CHEGADA

Sendo o meu Pelotão escalado para a frente da coluna, eu próprio quando batia a picada fazendo reconhecimento pelo fogo, ao segundo cunhete aberto deparei-me novamente com balas de madeira. Comunicado o assunto ao Comandante de Pelotão recebi um cunhete de balas verdadeiras e ordem de parar com o fogo de reconhecimento e fazer reconhecimento pela observação atenta da mata e bermas da picada: devia esquecer o caso, não falar mais no assunto, progredir com rapidez e poupar as balas de matar. O Cap. Comandante não queria discutir mais o assunto e atrazar a marcha sobre Nambuangongo.
Posto o Esquadrão em marcha não havia mais condições de voltar atrás ou acampar, isso seria um sinal de fraquesa que contrariava totalmente a visão táctica militar do Comandante. Pelo contrário, face a tal facto que faria voltar de novo a discussão à estaca zero, o Comandante colocou o pelotão de Panhards blindadas na frente da coluna e ordenou a máxima rapidez na progressão.

O ENCONTRO DOS COMANDANTES COR. MAÇANITA E CAP. RUI ABRANTES

Como grande estratega militar, o nosso Comandante, já percebera que o inimigo reunira todo o seu esforço de defesa sobre Zala e que, naquele momento, estava batido e convencido da impossibilidade de deter as nossas Tropas tanto mais que sabia que o Bat. 96 do Cor. Maçanita também já havia rompido a defesa do inimigo e estava às portas de Nambuangongo. Também fora por estar convencido da justeza da sua visão sobre a situação militar do inimigo que quizera arrancar imediatamente de Zala no dia anterior e discutira acesamente com os outros Oficiais. Agora, uma vez o Esquadrão em marcha só pensava em atingir Nambuangongo o mais rápido possível e surpreender o inimigo e não ser surpreendido, como era estratégia estabelecida para actuação do Esquadrão.

O ABRAÇO DOS COMANDANTES DO BAT. 96 E ESQ. 149

O caso foi que o inimigo só deu sinal de vida logo a seguir ao arranque de Zala com uns tiros de muito longe sem consequências e depois limitou-se a acompanhar e observar de longe a nossa progressão sem parar directa a Nambuangongo. O obstáculo maior foi a travessia do Rio Uembia a 6 kms do objectivo final dado a ponte ter sido destruida e ser preciso reabrir uma antiga passagem a vau ao lado da ponte abatida. Levámos quase a noite toda do dia 9 para 10 a fazer a travessia do Rio Uembia e no dia 10Ago61 às 9,00 horas atingimos Nambuangongo onde as Tropas do Bat. 96 do Cor. Maçanita haviam chegado às 17,00 do dia anterior e nos receberam com saudações de grande entusiasmo e alegria.


UM SOLDADO DO BAT. 96 FEZ TOCAR O SINO À NOSSA CHEGADA E AO HASTEAR DA BANDEIRA

HASTEAR DA BANDEIRA PORTUGUESA NA CAPELA DE NAMBUANGONGO

..................................................................................

Viriato, chefe guerreiro lusitano
do ataque bate e foge, do engano,
do sempre em movimento,
do vem de milhas e vai pra milhas,
das emboscadas e armadilhas,
do sem casa nem acampamento
certo, sem noite, dia ou hora,
tal qual o nosso Esquadrão labora.
Na nossa guerra o guerrilheiro
era o preto mas a nossa táctica
adoptada supunha uma prática
de atacar de surpresa e primeiro,
usando ensinamentos e cartilhas
de Viriato que era preto entre virilhas.

................................................................
Excerto do poema "Viriato" do livro "Esquadrão 149, a Guerra e os Dias" de José Neves

Sem comentários:

Enviar um comentário