sábado, 23 de outubro de 2010

EPISÓDIOS 149 I

OPERAÇÃO "VIRIARO" NOITE E DIA

No rescaldo da nossa recente confraternização em Rio Maior, à noite à conversa com o Comandante Rui Abrantes na casa do Palhavã, Furriel Miliciano do 149, falávamos da iniciativa imprevista e única e do surpeendente sucesso que tinha sido a decisão de avançar noite e dia sem parar ou acampar.

E o Comandante Abrantes explicou como surgiu a idéia. E disse:
- Na noite do 3º acampamento na Fazenda Matombe, do fazendeiro Ribeiro que nos servia de guia, este, às tantas, falava dos medos tradicionais que os pretos tinham da noite e que consideravam a noite um tempo exclusivamente para descansar e estar com as mulheres. Talvez um sentimento ancestral desenvolvido por via cultural da moralidade ensinada e transmitida pelos chefes religiosos feiticeiros e quibandas-.

Atento ouvidor, militar corajoso, estratega operacional intuitivo e académico, a inesperada revelação do guia tocou àlerta no pensamento do Comandante que, passado um curto tempo de refexão individual, logo convocou uma Reúnião Geral de Oficiais para propôr que o Esquadrão arrancasse de madrugada e não acampasse ou parasse mais entre objectivos, isto é: avançar noite e dia sem parar.
Perante tão inesperada proposta de actuação sem precedentes, os Oficiais do Esquadrão e dos Pelotões adidos aceitaram o repto. Com algumas objecções, uns mais crentes outros menos, certo era que naquela altura já quase todos no Esquadrão acreditavam nas qualidades de lider militar e carisma pessoal do Comandante Rui Abrantes, confiavam nele e segui-lo-iam apesar dos riscos inerentes.
De madrugada arrancámos para a tomada de Zala numa batalha com tiros permanentes de cada lado e progressão de 800 m/h durante um dia inteiro. Em Zala acampámos para recolocar a bandeira portuguesa no Posto Administrativo, evacuar feridos e fazer reabastecimentos diversos e munições. Depois fez-se a arrancada para Nambuangongo, sempre noite e dia, com grande rapidez e total sucesso.

Finalmente, a estratégia definida a partir da ideia revelada pelo guia, desde aquela data, foi usada sempre com total adesão dos Soldados, pois confirmou-se que a noite era realmente descanso do inimigo e, passando a ser sobre-trabalhos nossos, foi também descanso nosso de perigos, tiros, feridos ou mortos: nunca fomos atacados ou incomodados durante a progressão de noite.


Nota: fotos e legendas manuscritas do 2º Sarg. Leitão (transmissões)
Clique na imagem para ver pormenores e legendas

domingo, 17 de outubro de 2010

ENCONTRO 149 DE 2010

No dia, horas e local certos previstos, realizou-se o nosso encontro anual de antigos combatentes e familiares do Esquadrão de Cav. 149, que foi e é nosso orgulho de pessoas adultas conscientes do dever a que foram obrigadas e realizaram sem mácula ou vergonha.
O encontro e confraternização dos vivos realizou-se no largo à porta da igreja de Rio Maior e, no interior desta a devida homenagem ao encontro da memória viva e respeito pelos heróis quer tombados em combate em serviço da guerra, quer tombados em paz em serviço do país.
Comovedor nestes encontros é notar que vivos e mortos confraternizam entre eles através das histórias passadas e vividas em comum e, nesta ocasião, sempre revisitadas e contadas por novos intérpretes e sob aspectos diferentes. E comovedor também é constatar que a maioria das histórias vindas ao convívio são, precisamente, as vividas com ou protagonizadas pelos ausentes da vida, o que prova que os inevitáveis ausentes também são os mais presentes na recordação das nossas memórias de vida e morte na guerra.
É como se, naquelas nossas reuniões, nos visitasse e co-existisse entre e dentro de nós um deus bom e nosso amigo, recém-vindo de propósito, para quem não há presentes e ausentes mas apenas combatentes vivos.